As despedidas são a parte pior dos finalmentes. Somos passarinhos quase recém-nascidos que chegou a hora de voar sozinhos. Acabou a confusão, as gargalhadas de fundo, as mangas arregaçadas, os dedos pintados, as manchas malditas na roupa. Acabou. Abandonámos território de braços suspensos, com a memória cheia de experiências, de momentos bons, momentos maus, de descobertas, de histórias, de vidas entrelaçadas. Não queremos voltar mas também não queriamos partir.

Hoje sinto por dentro todo o silêncio do mundo.
Seremos para sempre crianças, com a mesma espontaneidade irreflexiva e o mesmo turbilhão de emoções a correr por baixo da pele das nossas mãos. um não ao nunca mais aturar idiotas e pessoas sem carácter. É este o contentamento de sermos crianças eternas, de sofrermos do complexo de peter pan, de tocar às campainhas e fugir depois, em que o intuito não era o de obrigar as pessoas a irem à porta, era a adrenalina de não sermos apanhados, de sermos só nós mas felizes assim.. Crianças. Jovens. Sempre. Ir dançar para uma discoteca até ao amanhecer. fase de rebeldia. fumar um cigarro sentada no meio da estrada. beijar e abraçar as pessoas mais importantes da minha vida. Temos de fazer mais coisas assim. agora e sempre. Viver loucos pela loucura, sabendo que somos amados de verdade.
Hoje só os papéis continuam a ser os mesmos, as pessoas não. As pessoas estão muito diferentes, quase não se reconhecem, é uma confusão. Acontecem coisas a mais em tempos cada vez mais breves. É arriscado pensar o que quer que seja sobre quem quer que seja, quanto mais dizê-lo. O tempo desfoca qualque juízo mal é proferido, quer seja moral ou estético. As caras transmudam-se pela noite e os bares são uma abstracção onde se cruzam indivíduos múltiplos. Os sentimentos escasseiam. É preciso sentir coisas e é cada vez mais difícil. Há muita gente que desiste, desaparece, muda de sítio. Nem os vícios já são puros. Os papéis continuam os mesmos, as pessoas não.
A vida tem cantos e momentos simples, de linhas claras e curvilínias, interpeladas por vírgulas, e com um etc. mesmo a fugir do nosso campo de visão. A simplicidade é uma dádiva, um segundo, um querer estar onde tudo é normal, onde tudo é verdadeiro e pouco ilusório. O descer à terra nunca compreteu um futuro onde queremos estar, lá no alto, todos queremos isso, de uma forma ou de outra queremos ser desejados, vangluriados pelo menos por uma fracção de segundo, num soslaio em olhar, esguio, directo a nós.
As coisas simples, as coisas que fazemos todos os dias podem ter o seu encanto quando, finalmente, encontramos um sentido ou uma presença que nos faça fazê-las com mais gosto, com um toque especial. Porque um beijo na boca na rodoviária, um jantar só de amigos arquitontos e um pequeno distúrbio físico-comportamental pelo e por amor é sempre melhor do que o quotidiano solitário que todos sentimos querer perder, jogar para trás do sofá ou mandar para um mar que nunca regressa.




"A vida de qualquer rapaz deve ser ler, escrever e correr atrás das raparigas. Esta última parte é muito importante. Hoje em dia, porém, os rapazes já não correm atrás das raparigas – andam com elas. A diferença entre “correr atrás” e “andar com” é, sobretudo, uma diferença de energia. Correr é galopar, esforçar, persistir, e é alegria, entusiasmo, vitalidade. Andar é arrastar, passo de caracol, pachorrice, sonolência. O amor não pode ser somente uma partida de golfe, em que dois jarretas caminham devagar em torno de alguns buraquinhos. Tem de ser, pelo menos, os 400 metros barreiras.(...)

A verdade é que o coração é um órgão bastante precioso e só se dá ao trabalho de subir à boca quando se lhe dão excelentes motivos para isso. De uma maneira geral, todas as palavras que não se imaginam num soneto de Camões são impróprias. O amor pode ser um fogo que arde sem se ver, mas não basta tomar o facto por dado e dizer simplesmente “Bute” – é preciso dizer que arde sem se ver. Mesmo que não arda, mesmo que se veja."

Miguel Esteves Cardoso, piropo


tenho a pele gasta pelo sol e sorrio porque faz parte do meu feitio, para camuflar a dor na alma que me asfixia. sonho todos os dias acordada. queria ser mais feliz. feliz no sentido de conseguir acordar todos os dias com um sorriso verdadeiro nos lábios, com o coração descansado e com todas as pessoas que me dizem algo mais perto. vivo ao sabor do vento, e logo eu... que não gosto nada de vento...

todos os dias penso em coisas que quero muito que aconteçam. manhãs bonitas, tardes bonitas, noites bonitas, dias bonitos. todos os dias penso que já falta menos um dia para essas coisas acontecerem. e depois há os dias em que sei que a probabilidade de isso não acontecer tão cedo é grande. demasiado grande.
Daria na praia, caso seguisse em linha recta, mas segui à direita, à direita, à direita e à direita, porque não me conduzia um pensamento linear.
Budapeste, Chico Buarque
não tenho forma de caminhar em linha recta.
Tenho andado da mesma forma pelas calçadas, com um destino onde não me quero encontrar. apenas permaneço perdida por entre estranhos e isso nesta terra é bom, faz-me sentir maior do que sou, mais grandiosa no mundo. sei que sou um ponto por entre milhares de outros pontos iguais, todos com a mesma fé: encontrar aquilo que procuramos a vida toda e não temos a certeza exacta do que seja. sou uma entre milhares que quer ser feliz. apenas isso, feliz. pois eu sou uma menina de uma terra natal, apenas isso.
O estar rodeada de pessoas que gostam de ti, que te querem por perto, abraçá-las e sorrir pelo momento..é bom. Mas não sei explicar, indiscritivelmente são nestes dias que quero estar só, abandonada ao abandono, olhando a gardunha com algum jazz aos ouvidos e saber que não existe ninguém ao meu lado para me dar a mão nem um ombro onde me possa encostar. São estes dias que me dão vontade de sentar numa mesa ao canto de um café e pedir um pequeno-almoço só meu. E depois andar o dia todo pela terra com os meus pensamentos, fazendo uma introspecção de mais um ano que passou. Voltaria apenas a casa, a todo aquele conforto da família depois do sol se pôr. Entrava de esgueira para o meu quarto e fingia que nada aconteceu, que foi um dia igual a tantos outros.
 
E foi assim que descobri que todas as coisas continuam para sempre, como um rio que corre ininterruptamente para o mar, por mais que façam para o deter. Sabes, quem não acredita em Deus, acredita nestas coisas, que tem como evidentes. Acredita na eternidade das pedras e não na dos sentimentos; acredita na integridade da água, do vento, das estrelas. Eu acredito na continuidade das coisas que amamos, acredito que para sempre ouviremos o som da água do rio onde tantas vezes mergulhámos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes parámos, para sempre seremos a brisa que entra e passeia pela casa, para sempre deslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhámos o céu e interrogamos o seu sentido. Nisto eu acredito: na verdade destas coisas sem princípio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traídos. (…)Porque nada é mais íntimo e mais indestrutível do que o silêncio partilhado. Tudo o resto são apenas palavras, sons, frases, coisas que qualquer um pode dizer. (...) Mas o silêncio fica porque nunca mente, porque é tão íntimo que não pode ser representado, é tão envolvente que não pode ser rasgado. (...) Nunca devemos amar em silêncio, nada é mais perigoso do que dividir com outrem os pensamentos vividos em silêncio. Um amor feliz precisa do turbilhão das palavras, das frases aparentemente inúteis e sem sentido, precisa de adjectivos, de elogios, do ruído das banalidades. Não há felicidade que não seja tantas vezes fútil, tantas vezes inútil.


Não Te Deixarei Morrer, David Crockett, de Miguel Sousa Tavares
Hoje brindaremos pela noite fora. Beberemos uma vodka e/ou uns shots à tua honra, à nossa honra. Curtiremos a vida pelos dias que já vivemos, pela amizade que me dá confiança, pelo laço que estabelecemos através de longos anos, com diversas convulsões. e nunca partis-te. permaneces-te. Sempre da mesma forma, daquela maneira de que eu tanto gosto, com expressões e bocejos que eu já sei decor. Coisas... que eu tanto sei, pelo teu rosto de pura amizade. Carina é uma miúda que eu tanto admiro, e que em tanto diverge de mim, e talvez por isso, isto perdura, porque nisto já batalhámos muito. Juntas.
Hoje brindaremos a isso, a minha Carina faz anos, yeh!
O rio passa, passa
e nunca cessa.
O vento passa, passa
e nunca cessa.
A vida passa:
nunca regressa.
Herberto Helder

Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe. Oscar Wilde
Viver constantemente na eminência é uma merda, e somos eternos amantes de um pecado sem volta, que é o mesmo que viver à beira de um abismo e gostar. é como eu digo a vida é tramada! Digo-vos sofremos de um transtorno filosófico, somos naturalmente confusos e lutadores de causas, nem que seja pelo amor que quero viver um dia, o problema é que lutamos por causas que já consideramos perdidas. mas porque é que o ser humano passa a vida inteira a construir sonhos com base em receios sem sentido aparente?
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes! E eu acreditava. Acreditava porque ao teu lado todas as coisas eram possíveis. Mas isso era no tempo dos segredos. Era no tempo em que o teu corpo era um aquário. Era no tempo em que os meus olhos eram dois peixes verdes. Hoje são apenas os meus olhos.
Eugénio de Andrade