não evito o coração aos sobressaltos, a paixão avassaladora pelos pequenos pormenores, os silêncios nas palavras de ouro e as esperas intermináveis.
volto porque me incitam as palavras e todo o sentimento que ressoa aqui dentro. aqui, onde sempre guardo um bálsamo energético e pulsante, que bombeia sangue e inquietação. volto porque a ausência sabe-me a sal e, ainda que o regresso seja embebido em água do mar, saceia, porque "sou", porque "estou", neste percurso de presentes constantes e de hiatos fantásticos que me põem à disposição da vida. volto porque não sei viver sem! volto para alimentar este vício que me norteia por entre os caminhos que tomo, e que revelam uma sede incrivelmente sôfrega e que me faz embriagar-me na sobriedade. volto porque resido nesta casa de tantos fenónemos, de tantas lembranças, de tantos disfarces e "robertos", de tantos vãos do meu coração. volto para poder respirar com a simplicidade de outrora, desafogando os sonhos, os amores e os receios. volto para dizer que fui, como tantas vezes, e que voltei, como tantas outras, para mais um presente de ventos corriqueiros, para desgastarem o meu corpo, preso neste tempo, que se arrasta e que se estende diante dos nossos olhos. volto para não ser parte desta multidão de "cães", "cadáveres adiados", "cabeças a rolar pelo chão" e de uma "mocidade pálida". volto para não ficar inerte, eu não careço de mobilidade, tenho os pés assentes no chão. e volto para aprender: o tempo é móvel, não posso viver um presente, retomando sucessivamente ao passado. tudo flui, nada permanece o mesmo... portanto não estamos a horas de nos compadecermos. eu volto porque não estou satisfeita!

parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. já ninguém quer viver um amor impossível. já ninguém aceita amar sem uma razão. quem quererá, afinal, um amor que nos roube a metade mais selvagem e inocente de nós? quem quererá, um amor puro, estúpido, cego e doente?
passamos demasiado tempo a desejar alguém do nosso lado, não por mera companhia, mas por uma série de pequenas dependências que trazem algum sentido às conquistas e às perdas. ansiamos alguém com quem dividir as experiências quotidianas, alguém para desabafar sobre qualquer coisa, alguém com quem compartilhar palavras e sentimentos e sentir alguma reciprocidade. essas pessoas aparecem. algumas por algum tempo, outras pelo sempre que durou, mas nunca numa constância suficiente a nos fazer acreditar que possam ser insubstituíveis. há aquelas que fluentemente passam, há as que passam e deixam um tanto, mas não há aquelas que fiquem por completo dentro de nós como deveria ser. os encontros começam a ser tão relativos, que o mais fácil, o mais credível, é que estamos talhados para os desencontros. e de tal forma que nos imerge uma imensidão de desespero, de desistência. porém, se hoje eu vos puder dar um conselho eu digo-vos, para nunca desistirem de encontrar o amor nas pessoas, nem de, sobretudo, deixarem de doar o amor sincero que vem de dentro. por mais que doa, eu digo-vos: amem!
Não me perguntes, porque nada sei
Da vida,
Nem do amor,
Nem de Deus,
Nem da morte.
Vivo,
Amo,
Acredito sem crer,
E morro, antecipadamente
Ressuscitando.
O resto são palavras
Que decorei
De tanto as ouvir.
E a palavra
É o orgulho do silêncio envergonhado.
Num tempo de ponteiros, agendado,
Sem nada perguntar,
Vê, sem tempo, o que vês
Acontecer.
E na minha mudez
Aprende a adivinhar
O que de mim não possas entender.
Miguel Torga

Falhei. A chuva da madrugada fez-me acordar, estendi as mãos e o pulso era esporádico como uma gota de orvalho. Enroscei-me no meu canto, juntando os joelhos com o peito, e assim perpetuei. Como uma pedra. Supondo que como tal, não se prendia a mim a responsabilidade, a consciência, a culpa. No entanto, desesperei, dei punhadas no peito e na cabeça, e senti a minha alma a corroer-se, faltavam-me as palavras que a tinham inaugurado. Não conseguia dizer quem sou e nem dei com as palavras que o melhor explicassem. Falhei. Por baixo do que exponho de mim, há um "eu" que calo. Qual deles o mais mudo? A dúvida é o privilégio de quem viveu muito. Será por isso que não consigo convencer-me a aceitar como certezas o que para mim mais se parece a falsidades. Quem sou eu? É mais do que óbvio. As dúvidas, as suspeitas, as perplexidades, as transgressões, os recuos, estão cá. No final errantes somos e pela estrada andamos. Todos, tanto os sábios como os ignorantes, os santos como os pecadores. É inevitável, fatal como a decrepitude. E a vida. Agora a língua essa é que é bífida. O mesmo é dizer, traiçoeira, aleivosa, desleal, pérfida e outras lindezas equivalentes.
Equilibrar-nos-emos como loucos, como justos, nesta calçada de perdões e lamentos. Cheios de esperança, é assim que temos lidado com a vida. Aguçamos os sentidos e estendemos os dedos. Dedos livres, tão livres que parecem pequenos farrapos de uma alma que se esfuma. Dedos livres que ondulam com um amor metódico, melódico, complexo, irremediavelmente e erradamente irreversível e irreparável. Estes dedos são o teu equilíbrio, são as tuas raízes. 
no ano passado ansiava por realizar sonhos. este ano, por esta altura, sei que ainda não os realizei. no próximo ano espero não estar a dormir.
 é sofrego o olhar
violento o espasmo do real.
deixem-me nascer,
que preciso de me reinventar!
que não posso com o nosso desgosto,
e a pena de todos os outros.

não deixes tudo ficar como está, eu sei que precisas de um mundo novo. sei que sentes que viverás perpetuamente entre as mesmas paredes. no entanto, digo-te, sinceramente, que vale a pena lutar pelos nossos desejos. encarar de frente as coisas boas e desejáveis e fixar o olhar sobre as coisas desagradáveis e que nos afligem constantemente. isto porque saberás pelo menos que não vives uma farsa, mas que vives feliz perante as incompreensões, falhas e dificuldades. o objectivo é ousares. atreveres-te a estar bem, nem que isso dependa do facto de ultrapassares limites que são reprováveis para ti. estas não podem suprimir a tua felicidade. tu pertences a este mundo, sabes quem és, este tem que ser o teu verdadeiro ímpeto. deslumbra-te com o caminho bifurcado, e segue em frente, segue. não deixes que a rotina que todos nós conhecemos te consuma. o eco do teu mundo não te pode deixar exasperada. não há nada mais deprimente, que a irrevogável certeza de que podias ter alterado o teu mundo, que podias ter cumprido os teus desejos. não fiques expectante. sobressalta-te, tu consegues, e conseguirás o que pretendes de ti. existe sempre magia no teu trilho.