Falhei. A chuva da madrugada fez-me acordar, estendi as mãos e o pulso era esporádico como uma gota de orvalho. Enroscei-me no meu canto, juntando os joelhos com o peito, e assim perpetuei. Como uma pedra. Supondo que como tal, não se prendia a mim a responsabilidade, a consciência, a culpa. No entanto, desesperei, dei punhadas no peito e na cabeça, e senti a minha alma a corroer-se, faltavam-me as palavras que a tinham inaugurado. Não conseguia dizer quem sou e nem dei com as palavras que o melhor explicassem. Falhei. Por baixo do que exponho de mim, há um "eu" que calo. Qual deles o mais mudo? A dúvida é o privilégio de quem viveu muito. Será por isso que não consigo convencer-me a aceitar como certezas o que para mim mais se parece a falsidades. Quem sou eu? É mais do que óbvio. As dúvidas, as suspeitas, as perplexidades, as transgressões, os recuos, estão cá. No final errantes somos e pela estrada andamos. Todos, tanto os sábios como os ignorantes, os santos como os pecadores. É inevitável, fatal como a decrepitude. E a vida. Agora a língua essa é que é bífida. O mesmo é dizer, traiçoeira, aleivosa, desleal, pérfida e outras lindezas equivalentes.

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