está a fechar-se um ciclo na minha vida. quando acaba um, começa logo outro. melhor ou não, talvez para o ano vos saiba dizer. bom, vemo-nos para o ano que vem, até lá. boa sorte para nós.
queria reunir todas as memórias falhadas e converte-las numa fonte de inspiração. queria ganhar coragem para fazer aquilo que tenho vindo a adiar. queria estar mais tempo com aqueles que me esqueci de amar. queria fazer saidas de amigos sem me preocupar com o burburinho dos pais. queria olhar para o mar mais vezes. queria começar a escrever poesia, e quem sabe, sentir os versos a bradar nos meus lábios. queria ser mais selvagem, espontânea. queria quebrar o silêncio que há muito se ocupou do meu lar. queria parar com os sentimentos acres, ainda que, sofra do complexo do peter-pan. queria saber se terei com quem contar, sempre, com quem caminhar o dia inteiro, com quem ver filmes, com quem falar, nem que seja sobre o tempo. queria saber como é que serei aquela mulher que jamais saberei ser. queria continuar a te-lo ao meu lado. queria surpreender-me todos os dias, sentir-me viva. queria. queria. queria um 2011 assim.
Uma ocasião uma jornalista perguntou a Vinicius de Morais se tinha medo da morte.
O poeta respondeu com um sorriso:
- Não, minha filha. Tenho saudades da vida.
Olho em volta e todos se queixam. Fazem cara feia ao acordarem e encaram a vida de lado como se fossem vitimas do destino. É a crise que afecta a todos. É o dinheiro que não estica. É a vida que não corre bem. É os nervos que começam a atrofiar. É a falta de confiança. É a carreira que não evolui. É a rotina do dia-a-dia que já cansa. É os arrufos de namorados. É a falta de namorados. É as más notas. É a média baixa. É o raio do tempo que ora chove, ora faz sol. É isto e aquilo e "coitadinho de mim que não dou para tudo".
E o mundo para ver e tanta coisa para fazer e não páram de encalhar na mesma porra da mesma coisa. Ninguém se lembra de abrir os olhos e reagir.
Caramba! Tanta pieguice. Tanta coisa para não fazerem nada se não queixarem-se da merda da vida que rabiscam e não assinam.
"eu não sou boa nem quero sê-lo, contento-me em desprezar quase todos, odiar alguns, estimar raros e amar um."
eu e Joana gostamos de falar de filmes, de chorar a vê-los, de imaginar a nossa vida como se ela também fosse uma película. mas já descobrimos que não há príncipes encantados.
eu e a Joana gostamos de imaginar que vamos ser felizes, que "vai correr tudo bem".
eu e a Joana queremos um homem que nos diga que temos o nome mais bonito do mundo.
eu e a Joana gostamos de escrever histórias de amor, gostamos de ver filmes...
eu e a Joana somos uma espécie de viagem de carro, numa estrada qualquer. já batalhámos e sorrimos tanto juntas que as recordações que teremos, lado a lado, serão apenas de árduas conversas, e de estupidezes banais.
talvez goste tanto dela por em alguns aspectos e decisões ser semelhante a mim.
não imagino a minha vida sem "eu e a Joana".
"Cansamo-nos de tudo, excepto de compreender.
Cansamo-nos de pensar para chegar a uma conclusão, porque quanto mais se pensa, mais se analisa, mais se distingue, menos se chega a uma conclusão.
Caímos então naquele estado de inércia em que o que mais queremos é compreender bem o que é exposto - uma atitude estética, pois que queremos compreender sem nos interessar, sem que nos importe que o compreendido seja ou não verdadeiro, sem que vejamos mais no que compreendemos senão a forma exacta como foi exposto, a posição de beleza racional que tem para nós.
Cansamo-nos de pensar, de ter opiniões nossas, de querer pensar para agir. Não nos cansamos, porém, de ter, ainda que transitoriamente, as opiniões alheias, para o único fim de sentir o seu influxo e não seguir o seu impulso."
Bernardo Soares, Livro do Desassossego, pp. 236-237


Atreve-te a pensares por ti próprio. Luta! Persiste! Sente a grandeza de uma alma única.
Rita Raposo
Não sei de que cor são os navios
quando naufragam no meio dos teus braços
sei que há um corpo nunca encontrado algures no mar
e que esse corpo vivo é o teu corpo imaterial
a tua promessa nos mastros de todos os veleiros
a ilha perfumada das tuas pernas
o teu ventre de conchas e corais
a gruta onde me esperas
com teus lábios de espuma e de salsugem
os teus naufrágios
e a grande equação do vento e da viagem
onde o acaso floresce com seus espelhos
seus indícios de rosa e descoberta.
Não sei de que cor é essa linha
onde se cruza a lua e a mastreação
mas sei que em cada rua há uma esquina
uma abertura entre a rotina e a maravilha .
há uma hora de fogo para o azul
a hora em que te encontro e não te encontro
há um ângulo ao contrário
uma geometria mágica onde tudo pode ser possível
há um mar imaginário aberto em cada página
não me venham dizer que nunca mais
as rotas nascem do desejo
e eu quero o cruzeiro do sul das tuas mãos
quero o teu nome escrito nas marés
nesta cidade onde no sítio mais absurdo
num sentido proibido ou num semáforo
todos os poentes me dizem quem tu és.
Manuel Alegre (1936)
As pessoas vão e contam irremediavelmente. e contam tudo, cedo ou mais tarde, o interessante e o fútil, o privado e o público, o íntimo e o supérfluo. No entanto, há coisas que devem permanecer no oculto e que têm de ser difundidas (também), a mágoa e as alegrias e o ressentimento, os agravos e a adoração e os planos para a vingança, o que nos orgulha e o que nos envergonha, o que parecia um segredo e o que pedia sê-lo, o consabido e o inconfessável e o horroroso e o manifesto, o substancial - o enamoramento - e o insignificante - o enamoramento. Sem pensar duas vezes. Tenho um segredo pregado à alma. ou muitos.Tenho tanta coisa. tanto para te contar e definir que seria mais fácil bradar aos céus a minha alma para que tu, onde quer que estivesses, me ouvisses. Não haveria julgamentos nem algo que se assemelhasse. Apenas a minha voz ouvirias como uma nota musical a sair de um instrumento e a preencher o teu espaço. Seria o nosso segredo, a minha confissão espiritual.
A neve pôs uma toalha calada sobre tudo.
Não se sente senão o que se passa dentro de casa.
Embrulho-me num cobertor e não penso sequer em pensar.
Sinto um gozo de animal e vagamente penso,
E adormeço sem menos utilidade que todas as acções do mundo.
Alberto Caeiro, poemas inconjuntos

Já merecíamos um dia de folga, um dia de neve. Novembro é uma criança pequena. Novembro tem mãos de branca de neve. e sorriso de peter pan.
Não há nada como coisas simples, gestos genuínos, depois de uma dia desgastante. depois de um dia de trabalho, que vemos passar por entre o esforço do pestanejar. nada melhor do que ter um lar. um beijo na testa depois de chegar a casa, uma torrada de manteiga com um chá preto feitos a pensar em mim, ou mesmo um simples abraço de reconforto no sofá, quando algo correu mal. afinal, do que sobrevive o amor? senão destas pequeninas coisas.

E foi assim:
Um abraço de mel,



Um suspiro de fel.
às vezes tu dizias que acordar com os olhos cegos nas nuvens de uma montanha era como crescer sem dar por isso. desejo um retiro, um abrigo no meio do ar, onde ninguém me possa ver, muito menos visitar, ou partilhar uma palavra amiga, porque sabem que o dia está mais triste para mim. a parte importante do caminho (da montanha) é o acto de o percorrermos sozinhos. agora, preciso de seguir sozinha, sem uma mão a amparar-me o jogo, pelo menos desta vez. Necessito de uma montanha (russa) e um olho cego de aventura..
Hoje a maior parte do tempo não ouvia ninguém: lia revistas de modelos, tão diferentes das mulheres, magras, bonitas e quase sem roupa que namoravam jogadores de futebol ou actores de novela, de peito ao léu. Mas que graça?
Se não... É como amar uma mulher só linda.
E daí? Uma mulher tem que ter qualquer coisa além de beleza.
Qualquer coisa de triste,
qualquer coisa que chora,
qualquer coisa que sente saudade, um molejo de amor machucado.
Uma beleza que vem da tristeza de se saber mulher.
Há dias que não valem a pura pena e simplesmente porque ninguém nos disse que gostava de nós. Eu sei que isto não é tudo, mas em dias em que a sanidade mental é decadente, isto nota-se mais.
A crise económica que Portugal vive é complexa, e não é fácil definir com exactidão o momento em que terá principiado.
O problema, creio eu, é que o nosso país sempre foi uma nação cheia de buracos mal tapados e muito menos remendados, e o pior disto tudo é que ninguém sabe como o fazer, e nisto temos todos a mesma opinião que o ministro das finanças: "- Não faço a mínima ideia".
Apesar de tudo, infelizmente, o povo português é difícil de contentar, aliás até se contenta, mas é a criticar inconscientemente, sem propôr uma sugestão plausível.
Que fazer? Bem sabemos que somos um país aos buracos, e que a cada passo, estamos constantemente na cordabamba, e das difíceis. Parecemos trapezistas de circo na iminência de cair, em que intercaladamente se ouve "-Agora sem emprego", "-Agora com impostos de cima de mim" - não deixa de ser uma grande habilidade circense.
Para além disto, o zé povinho está bem aos buracos, não há personalidade, não há uma voz que se erga, apenas há comodismo, passividade e julgamentos irresponsáveis. Ou seja, parecemos um pouco os consumidores que se fascinam pelo fenómeno da pulseira do equilíbrio, em que, segundo cremos, não tardará a produzir melhoras de qualidade de vida. Bem, com isto, talvez seja boa ideia avisar o governo para criar uma pulseira do equílibrio para os trapezistas de circo, um anel da esperança, um colar da constância, uns brincos da estabilidade e ainda uma gargantilha da harmonia. Enfim, teríamos um país muito mais próspero...ou iludido.
Que Portugal é um país pleno de corrupção já todos sabemos, agora que Portugal é como ficção científica, ainda não sabia até que ouvi Paulo Portas a efabular: "Imaginem dois submarinos que não capturam ninguém, embora haja uma dezena de arguidos à beira de serem capturados por causa deles, e que até chegarem ao seu destino, participam em aventuras incríveis, entre as quais se conta uma luta sangrenta com uma factura gigante". E assim todos vivemos num enorme e caríssimo submarino, cheio de buracos, que nos levam, consequentemente a afundar.

Esmiuça, Rita, Esmiuça.


friends will be friends, when your're in need of love they give you care and attention. friends will be friends when you're through with life and all hope is lost.
é terça-feira, tenho os lábios a sangrar e não há ninguém que me deseje boa noite.
também nos magoam. mesmo nos piores dias.
também nos desiludem.
também fingem.
também conseguem ser maus e supérfulos.

às vezes não pensam nem sonham o que nos vai dentro da alma. porque se soubessem não imaginariam o quanto doi à noite não conseguir dormir, ou o que custa dobrar cada esquina com o coração nas mãos. nem sequer sabem o que é ter um dia mau, do princípio ao fim. jamais vão sentir o travo sabor das lembranças que morrem esquecidas
às vezes, somos os únicos com este peso na alma.
sou uma pessoa que nunca está satisfeita totalmente. há sempre um vazio a preencher. vivo constantemente numa corda bamba vertiginosa. coração nas mãos, alma desfeita. um dia haverá uma forma de nos esquecermos de tudo. de olharmos para sítios e não nos lembrarmos de pessoas importantes que por um motivo ou por outro já não existem nas nossas vidas. haverá forma de camuflar a tristeza. limpar as lágrimas apenas em momentos perfeitos.
 
Cheguei a casa de olhar vazio. Carregado. Já pensaram o que é ter o olhar vazio? Não é somente o olhar que está vazio, sem sentido, sem qualquer tipo de intensidade. É a alma também.
Cheguei a casa de olhar vazio e emanava o mesmo perfume de sempre, não me encontrava há muito tempo. Não pelo menos em frente ao espelho de olhar. Estava diferente - vazio. Queria perguntar-me se estava sol lá fora, ou se estava tudo bem desde a última vez, se ainda gostava de castanhas e jeropiga em Novembro, ou se mais uma vez o comboio se tinha atrasado. Mas a minha voz falhava, e qualquer banalidade que lhe pudesse propôr tinha-se tornado em algo demasiado precioso para ser proferido. Eu estava linda, um vestido muito curto, as mãos leves, o cabelo solto. o olhar vazio, sim. o olhar continuava vazio, e eu não conseguia enchê-lo, nem falar.

decorarei o meu leito de morte com todas as recordações possíveis. todos os sorrisos abafados, todos os beijos tímidos, todos os trilhos em que caminhámos, todos os finais de tarde entrelaçados, todas as promessas, todos os sonhos tornados em realidade, todas as pontas desatadas, todas as horas em que enchemos o coração de medo para sobreviver ao desconhecido. irei pintálo em azul turquesa, pois faz-me lembrar o céu, apesar de eu nunca lá ter estado, e vou envolve-lo num manto de prata que roubei ao luar na noite que passou. decorá-lo-ei, frente aos meus olhos de terra, para me poder felicitar e saber, para todo o sempre, que fui alguém que passei por aqui, deixei uma pegada, uma alma e..vivi.
É natural que quem quer "elevar-se" sempre mais, um dia, acabe por ter vertigens. O que são vertigens? Medo de cair? Mas então porque é que temos vertigens num miradoiro protegido com um parapeito? As vertigens não são o medo de cair. É a voz do vazio por debaixo de nós que nos enfeitiça e atrai, o desejo de cair do qual, logo a seguir, nos protegemos com pavor. (...)
Poderia dizer que ter vertigens é embriagarmo-nos com a nossa própria fraqueza. Temos consciência da nossa fraqueza, mas, em vez de resistir-lhe, queremos abandonar-nos a ela. Embriagamo-nos com a nossa própria fraqueza, queremos ficar ainda mais fracos, cair por terra em plena rua à frente de toda a gente, ficar por terra, ainda mais abaixo do que a terra.
Kundera, M. in A Insustentável Leveza do Ser

qual o (real) peso da vida? Será este decidido por nós? Será essa pesagem da nossa inteira responsabilidades ou outros factores são, para si, absolutamente determinantes? Qual a melhor opção: uma existência levemente suportável ou uma existência mais pesada? Uma existência com o facilitismo da leveza ou uma existência com um peso responsabilizador? Que existência? Qual a sua efectiva definição? Poderá haver uma definição?
As despedidas são a parte pior dos finalmentes. Somos passarinhos quase recém-nascidos que chegou a hora de voar sozinhos. Acabou a confusão, as gargalhadas de fundo, as mangas arregaçadas, os dedos pintados, as manchas malditas na roupa. Acabou. Abandonámos território de braços suspensos, com a memória cheia de experiências, de momentos bons, momentos maus, de descobertas, de histórias, de vidas entrelaçadas. Não queremos voltar mas também não queriamos partir.

Hoje sinto por dentro todo o silêncio do mundo.
Seremos para sempre crianças, com a mesma espontaneidade irreflexiva e o mesmo turbilhão de emoções a correr por baixo da pele das nossas mãos. um não ao nunca mais aturar idiotas e pessoas sem carácter. É este o contentamento de sermos crianças eternas, de sofrermos do complexo de peter pan, de tocar às campainhas e fugir depois, em que o intuito não era o de obrigar as pessoas a irem à porta, era a adrenalina de não sermos apanhados, de sermos só nós mas felizes assim.. Crianças. Jovens. Sempre. Ir dançar para uma discoteca até ao amanhecer. fase de rebeldia. fumar um cigarro sentada no meio da estrada. beijar e abraçar as pessoas mais importantes da minha vida. Temos de fazer mais coisas assim. agora e sempre. Viver loucos pela loucura, sabendo que somos amados de verdade.
Hoje só os papéis continuam a ser os mesmos, as pessoas não. As pessoas estão muito diferentes, quase não se reconhecem, é uma confusão. Acontecem coisas a mais em tempos cada vez mais breves. É arriscado pensar o que quer que seja sobre quem quer que seja, quanto mais dizê-lo. O tempo desfoca qualque juízo mal é proferido, quer seja moral ou estético. As caras transmudam-se pela noite e os bares são uma abstracção onde se cruzam indivíduos múltiplos. Os sentimentos escasseiam. É preciso sentir coisas e é cada vez mais difícil. Há muita gente que desiste, desaparece, muda de sítio. Nem os vícios já são puros. Os papéis continuam os mesmos, as pessoas não.
A vida tem cantos e momentos simples, de linhas claras e curvilínias, interpeladas por vírgulas, e com um etc. mesmo a fugir do nosso campo de visão. A simplicidade é uma dádiva, um segundo, um querer estar onde tudo é normal, onde tudo é verdadeiro e pouco ilusório. O descer à terra nunca compreteu um futuro onde queremos estar, lá no alto, todos queremos isso, de uma forma ou de outra queremos ser desejados, vangluriados pelo menos por uma fracção de segundo, num soslaio em olhar, esguio, directo a nós.
As coisas simples, as coisas que fazemos todos os dias podem ter o seu encanto quando, finalmente, encontramos um sentido ou uma presença que nos faça fazê-las com mais gosto, com um toque especial. Porque um beijo na boca na rodoviária, um jantar só de amigos arquitontos e um pequeno distúrbio físico-comportamental pelo e por amor é sempre melhor do que o quotidiano solitário que todos sentimos querer perder, jogar para trás do sofá ou mandar para um mar que nunca regressa.




"A vida de qualquer rapaz deve ser ler, escrever e correr atrás das raparigas. Esta última parte é muito importante. Hoje em dia, porém, os rapazes já não correm atrás das raparigas – andam com elas. A diferença entre “correr atrás” e “andar com” é, sobretudo, uma diferença de energia. Correr é galopar, esforçar, persistir, e é alegria, entusiasmo, vitalidade. Andar é arrastar, passo de caracol, pachorrice, sonolência. O amor não pode ser somente uma partida de golfe, em que dois jarretas caminham devagar em torno de alguns buraquinhos. Tem de ser, pelo menos, os 400 metros barreiras.(...)

A verdade é que o coração é um órgão bastante precioso e só se dá ao trabalho de subir à boca quando se lhe dão excelentes motivos para isso. De uma maneira geral, todas as palavras que não se imaginam num soneto de Camões são impróprias. O amor pode ser um fogo que arde sem se ver, mas não basta tomar o facto por dado e dizer simplesmente “Bute” – é preciso dizer que arde sem se ver. Mesmo que não arda, mesmo que se veja."

Miguel Esteves Cardoso, piropo


tenho a pele gasta pelo sol e sorrio porque faz parte do meu feitio, para camuflar a dor na alma que me asfixia. sonho todos os dias acordada. queria ser mais feliz. feliz no sentido de conseguir acordar todos os dias com um sorriso verdadeiro nos lábios, com o coração descansado e com todas as pessoas que me dizem algo mais perto. vivo ao sabor do vento, e logo eu... que não gosto nada de vento...

todos os dias penso em coisas que quero muito que aconteçam. manhãs bonitas, tardes bonitas, noites bonitas, dias bonitos. todos os dias penso que já falta menos um dia para essas coisas acontecerem. e depois há os dias em que sei que a probabilidade de isso não acontecer tão cedo é grande. demasiado grande.
Daria na praia, caso seguisse em linha recta, mas segui à direita, à direita, à direita e à direita, porque não me conduzia um pensamento linear.
Budapeste, Chico Buarque
não tenho forma de caminhar em linha recta.
Tenho andado da mesma forma pelas calçadas, com um destino onde não me quero encontrar. apenas permaneço perdida por entre estranhos e isso nesta terra é bom, faz-me sentir maior do que sou, mais grandiosa no mundo. sei que sou um ponto por entre milhares de outros pontos iguais, todos com a mesma fé: encontrar aquilo que procuramos a vida toda e não temos a certeza exacta do que seja. sou uma entre milhares que quer ser feliz. apenas isso, feliz. pois eu sou uma menina de uma terra natal, apenas isso.
O estar rodeada de pessoas que gostam de ti, que te querem por perto, abraçá-las e sorrir pelo momento..é bom. Mas não sei explicar, indiscritivelmente são nestes dias que quero estar só, abandonada ao abandono, olhando a gardunha com algum jazz aos ouvidos e saber que não existe ninguém ao meu lado para me dar a mão nem um ombro onde me possa encostar. São estes dias que me dão vontade de sentar numa mesa ao canto de um café e pedir um pequeno-almoço só meu. E depois andar o dia todo pela terra com os meus pensamentos, fazendo uma introspecção de mais um ano que passou. Voltaria apenas a casa, a todo aquele conforto da família depois do sol se pôr. Entrava de esgueira para o meu quarto e fingia que nada aconteceu, que foi um dia igual a tantos outros.
 
E foi assim que descobri que todas as coisas continuam para sempre, como um rio que corre ininterruptamente para o mar, por mais que façam para o deter. Sabes, quem não acredita em Deus, acredita nestas coisas, que tem como evidentes. Acredita na eternidade das pedras e não na dos sentimentos; acredita na integridade da água, do vento, das estrelas. Eu acredito na continuidade das coisas que amamos, acredito que para sempre ouviremos o som da água do rio onde tantas vezes mergulhámos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes parámos, para sempre seremos a brisa que entra e passeia pela casa, para sempre deslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhámos o céu e interrogamos o seu sentido. Nisto eu acredito: na verdade destas coisas sem princípio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traídos. (…)Porque nada é mais íntimo e mais indestrutível do que o silêncio partilhado. Tudo o resto são apenas palavras, sons, frases, coisas que qualquer um pode dizer. (...) Mas o silêncio fica porque nunca mente, porque é tão íntimo que não pode ser representado, é tão envolvente que não pode ser rasgado. (...) Nunca devemos amar em silêncio, nada é mais perigoso do que dividir com outrem os pensamentos vividos em silêncio. Um amor feliz precisa do turbilhão das palavras, das frases aparentemente inúteis e sem sentido, precisa de adjectivos, de elogios, do ruído das banalidades. Não há felicidade que não seja tantas vezes fútil, tantas vezes inútil.


Não Te Deixarei Morrer, David Crockett, de Miguel Sousa Tavares
Hoje brindaremos pela noite fora. Beberemos uma vodka e/ou uns shots à tua honra, à nossa honra. Curtiremos a vida pelos dias que já vivemos, pela amizade que me dá confiança, pelo laço que estabelecemos através de longos anos, com diversas convulsões. e nunca partis-te. permaneces-te. Sempre da mesma forma, daquela maneira de que eu tanto gosto, com expressões e bocejos que eu já sei decor. Coisas... que eu tanto sei, pelo teu rosto de pura amizade. Carina é uma miúda que eu tanto admiro, e que em tanto diverge de mim, e talvez por isso, isto perdura, porque nisto já batalhámos muito. Juntas.
Hoje brindaremos a isso, a minha Carina faz anos, yeh!
O rio passa, passa
e nunca cessa.
O vento passa, passa
e nunca cessa.
A vida passa:
nunca regressa.
Herberto Helder

Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe. Oscar Wilde
Viver constantemente na eminência é uma merda, e somos eternos amantes de um pecado sem volta, que é o mesmo que viver à beira de um abismo e gostar. é como eu digo a vida é tramada! Digo-vos sofremos de um transtorno filosófico, somos naturalmente confusos e lutadores de causas, nem que seja pelo amor que quero viver um dia, o problema é que lutamos por causas que já consideramos perdidas. mas porque é que o ser humano passa a vida inteira a construir sonhos com base em receios sem sentido aparente?
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes! E eu acreditava. Acreditava porque ao teu lado todas as coisas eram possíveis. Mas isso era no tempo dos segredos. Era no tempo em que o teu corpo era um aquário. Era no tempo em que os meus olhos eram dois peixes verdes. Hoje são apenas os meus olhos.
Eugénio de Andrade