Não oiço ninguém, nem uma dessas vozes erra-dias que vêm na aragem - chamamentos, ralhos - tudo em silêncio sob a praga do calor. De súbito, desce sobre mim a mais intensa melancolia da desilusão, uma dor terrível, e a minha imagem fugitiva. E de novo, a minha súplica humilde - não caias! É mesmo incompreensível, e só, de certo, ao fim de muitos anos é que se irá entendendo. E à medida que se entende, permanece a mágoa que se aceita. A tristeza é apaziguada no cansaço e num certo retorno mental. Estou num esvaziamento total de qualquer interesse. Porquê? Para quê? Por nada! Para nada. Mas não perguntes. Felizmente para as pessoas sensíveis, dessas que sempre aplaudem espectáculos incómodos, sejam eles de que natureza forem, a língua,  só por si mesma, é razão suficiente. Não rezando, portanto, qualquer interrogatório ou torturas. E todavia, vejam vocês, estou a ponto de construir no meu nada de tudo, uma ideia de redenção com a memória do meu "eu", esse, que já nada é meu. A culpa pisa firme, parece ela que sabe aonde se dirige, como se seguisse o rasto do destino, aquele sempre confuso ir e vir de marcas e sinais, que é preciso observar com atenção para não estar a voltar para trás quem imagina avançar, sem desvios, directo, à morte.

2 comentários:

  1. Neste texto magnifico denoto um rendilhar de palavras em prosa que o comum de nós apalpa e pensa captar pela leitura, singularismo ignorando os dois pares e meios de asas sem sentido, com a tristesa imaginaria que cada letra esconde. felizmente, sim que partilhas e deixas uma friesta para que outros possam espreitar esse mundo consciente, que se escapa por atalhos do destinos, mas que encontra um entroncar no horizonte da vida. Morte? Todos para lá avançamos, e no meio de todo este caos, cumpre-nos a nós embarcar sem porquês e sem questionarmos a realidade que nos faz humanos.

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