Um hino aos que se deixam cair

E eu que sou o rei de toda esta incoerência,
Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la
E giro até partir... Mas tudo me resvala
Em bruma e sonolência

Se acaso em minhas mãos fica um pedaço de ouro
Volve-se logo falso... ao longe o arremesso...
Eu morro de desdém em frente de um tesouro
Morro à míngua, de excesso

Alteio-me na cor à força de quebranto
Estendo os braços de alma - e nem um espasmo venço!...
Peneiro-me na sombra - em nada me condenso...
Agonias de luz eu vibro ainda entanto

Não me pude vencer, mas posso-me esmagar
- Vencer, às vezes, é o mesmo que tombar -
E como inda sou luz, num grande retrocesso
Em raivas ideiais, ascendo até ao fim:
Olho do alto o gelo, ao gelo me arremesso

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Tombei...
E fico só esmagado em mim

Mário de Sá-Carneiro, A Queda

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